Por João Messias Jr.
Quem trabalha de forma correta, sempre
colhe os frutos. Não importa de que forma, mas a recompensa sempre aparece. O
trio de Technical Death Metal, Psychotic Eyes vem recebendo excelentes críticas
ao seu segundo trabalho, I Only Smile Behind the Mask. As resenhas positivas
têm destaque ao nível técnico atingido pela banda e pela produção, assinada por
JF Dagenais (Kataklysm).
Nesta entrevista com o guitarrista/vocalista
Dimitri Brandi, o músico nos conta da repercussão do trabalho, a opção de
lançarem apenas de forma virtual, entre outras coisas.
A palavra é sua, Dimitri:
Dimitri Brandi Divulgação |
NEW HORIZONS ZINE: Vocês estão na estrada
há mais de uma década. Conte como era praticar death
metal em 1999 e
como avaliam a aceitação ao estilo hoje.
Dimitri Brandi: O death metal já foi o
estilo mais popular
de metal no Brasil. Quando o Sepultura estourou no mundo, na época de Beneath the Remains e Arise, todo mundo
queria cantar gutural. Era uma situação parecida com o que aconteceu depois com
o estouro do Metal Melódico, em que todas as bandas novas queriam soar
como o Stratovarius. Quando começamos
a banda em 1999, os estilos mais extremos de metal estavam por baixo. O que
pegava era o metal melódico e o gothic metal com vocais femininos. Aos
poucos o thrash foi
ressurgindo, até estourar aquela onda de revival
do Thrash oitentista, que não nos
beneficiou, pois nunca quisemos soar retro. Durante a década de 2000 surgiram
grandes trabalhos no Death Metal,
principalmente de bandas como Behemoth,
Nile e Kataklysm. Mas o estilo
não recuperou a popularidade que teve antes, nem aqui no Brasil. Hoje são
poucas as bandas que tocam Death em
nosso país, mas felizmente são grupos excelentes.
NHZ: Em 2007 vocês lançaram o primeiro
álbum full de vocês, que tem o nome
da banda. Como foi a aceitação do CD?
Dimitri: Excelente, ficamos muito
felizes e orgulhosos! O disco foi produzido pelo Alex Nasser, grande amigo e músico,
ex-baterista do Avalon e do Scars. Lançamos o CD de maneira
independente, arcando com todos os custos de gravação, prensagem, divulgação e distribuição. O
disco foi muito elogiado pela crítica e pelo público, o que nos rendeu aparecer
entre as bandas revelação e nas votações de melhores do ano. Mas também serviu
de lição. Aprendemos como é difícil ser uma banda independente. Não conseguimos
boas vendas, não conseguimos agendar uma turnê, shows de lançamento, nada
disso. Mesmo investindo bastante no produto, por exemplo, fizemos um encarte de 16 páginas com todas as
letras traduzidas, mas isso pouca gente comentou. Essa decepção serviu de aprendizado para o
segundo álbum.
NHZ: Após o primeiro trabalho, a banda
sofreu mudanças de formação, se tornando um trio. Como foi adaptar as canções a
esse formato?
Dimitri: Foi um desafio para todos nós,
mas principalmente para mim, que acabei virando o único guitarrista. Agora não
tinha mais uma segunda guitarra para me apoiar, e eu deveria solar sem guitarra
base, o que exige mais em termos de timbre e composição ,
pois o solo tem que chamar atenção mesmo sem uma base. Para isso precisei da
ajuda dos mestres, tipo Alex Lifeson(Rush)
e o Victor
Smolsky (Rage), guitarristas que são extremamente hábeis nesse quesito, que
jamais precisaram de alguém fazendo base para eles. Mas a formação de trio
exige mais de todos os músicos, a bateria e o baixo tem que estar muito
mais encaixados, sincronizados e entrosados. Felizmente eu toco com dois
músicos fantásticos que são o Alexandre Tamarossi (bateria) e o Douglas Gatuso (baixo),
que adoram a proposta de Power-trio,
são entrosados e técnicos como poucos.
Psychotic Eyes Divulgação |
NHZ: Dando um salto no tempo, vocês
contaram com o auxílio do produtor
e músico do Kataklysm,
JF Dagenais para a concepção do que veio a ser o álbum I Only Smile Behind the Mask. O que os motivaram a essa escolha e se no Brasil não havia
ninguém que pudesse fazer esse trabalho?
Dimitri: Desde a primeira vez que ouvi
um disco produzido pelo Dagenais eu
imaginava que ele seria o
produtor perfeito para o Psychotic
Eyes. Foi com o disco “Epic” do
Kataklysm. Até hoje me impressiono com a qualidade dos timbres, com o peso e agressividade que o JF Dagenais conseguiu, sem nada soar
embolado, tudo nítido. Era esse tipo de som que imaginávamos para o nosso som,
precisamos de peso, mas mantendo cada instrumento em seu lugar, eu gosto de
ouvir os detalhes dos pratos da bateria, dos fraseados de baixo, sem que um
instrumento cubra os demais. No Brasil temos excelentes produtores, vários
profissionais muito esforçados, plenamente capazes de realizar esse trabalho,
mas o Dagenais foi uma escolha
pessoal, além de uma excelente oportunidade de aprender como é trabalhar no
padrão “gringo” de qualidade. Foi uma chance que não poderíamos perder, pois
ele ouviu nosso primeiro CD, gostou e aceitou a proposta de trabalhar conosco.
Tudo correu tão bem que já o convidei para trabalhar novamente conosco, no
nosso terceiro trabalho, e ele já aceitou!
Devida à colaboração de JF, vocês chegaram
a conversar sobre fazer algumas apresentações no Canadá,
ou mesmo por Europa e Estados Unidos?
Dimitri: Não. Ele não se envolve no
agendamento dos shows do Kataklysm,
eles são muito profissionais e lá fora rola uma separação especifica de
atividades. Ele é o guitarrista da banda, e só. Chegamos a comentar sobre uma
turnê conjunta na America do Sul, mas isso sempre depende dos produtores
locais, e
infelizmente aqui no Brasil temos preconceito contra as
bandas brasileiras. As bandas do exterior conseguem tocar aqui porque são
convidadas pelos mesmos produtores que rejeitam as bandas nacionais.
NHZ: Outra particularidade é que vocês
contaram com Rodrigo
Nunes ( ex-Drowned e Eminence) para gravar os baixos. Houve
alguma conversa para que ele ficasse na banda? Como chegaram ao atual dono dos
graves, Douglas Gatuso?
Dimitri: Seria impossível o Rodrigo ficar na banda, pois
ele mora em Belo
Horizonte e não tem vontade nenhuma de se mudar pra São Paulo
(risos). Ele é um excelente amigo
e baixista , e fez um trabalho excepcional. No meio da
gravação ficamos sem baixista, então liguei para ele pedindo socorro e ele
prontamente se dispôs a ajudar. Fui a Belo Horizonte e ficamos dois fins de
semana trancados no estúdio do Marcos do Drowned,
compondo as linhas de
baixo e gravando ao mesmo tempo. Depois que terminamos a
gravação, precisávamos de um baixista e por indicação de outro grande amigo , o Bodão do Side Effects, apareceu o Douglas, que é
também guitarrista de diversas bandas. É um excelente guitarrista, mas como
baixista ele é um dos melhores do Brasil, com certeza o melhor com quem já toquei.
Lamento que ele não tenha gravado o “I
Only Smile Behind the Mask”, mas com certeza ele vai mostrar um trabalho
ainda mais foda no nosso próximo álbum.
I Only Smile Behind the Mask Divulgação |
O disco em si aponta grande evolução, cheio
de músicas intrincadas e ao mesmo tempo, pegajosas. O que os bangers estão
achando do disco?
Dimitri: Temos recebido somente
comentários positivos por parte do público. As pessoas entenderam nossa
proposta de misturar Death Metal com
progressivo, sem esquecer dos estilos tradicionais do metal, como o Heavy Clássico, o Thrash e até mesmo o Hard
Rock. As críticas também têm sido em sua maioria, positivas. Alguns
críticos não gostaram, mas outros elogiam até de um jeito exagerado, dizendo
que fizemos uma obra-prima. Isso me deixa muito orgulhoso, mas confesso que
acho exagerado, ainda temos muito a aprender e a evoluir como banda. Poucos
discos são obras primas, embora tenhamos alguns assim aqui no Brasil , com o
último do Drowned, o “Tales of Death” (Zênite), “Traitors
Executers” (Side Effectz), “The
Hangman Tree” (The Mist), “Innocent Rise” (Monasterium), etc. Se “I Only Smile Behind the Mask” figurar
entre esses, estarei satisfeito!
NHZ: Vocês fizeram o show de lançamento no
Carioca Club, ao lado do Korzus e Torture Squad. Como foi o evento em si, visto
que o público foi para assistir as bandas citadas e o que pensam da realização
de eventos como esse em casas de porte médio, como o Carioca ?
Dimitri: Com certeza foi o melhor show da nossa
carreira. Tocamos muito bem e o
público adorou, respondendo muito bem ao nosso som, mesmo sem conhecer-nos,
afinal o “I Only Smile Behind the Mask”
sequer havia sido lançado. Apesar do público estar lá para ouvir Korzus e Torture Squad, temos que ter em mente que os fãs do metal nacional
são muito mais receptivos às bandas
novas do que aqueles que só ouvem bandas estrangeiras. Assim,
mesmo sem conhecer nosso som o público do Carioca deu um show à parte,
respondendo muito bem e de
maneira empolgada.
NHZ: Vocês optaram por lançar de forma digital, disponibilizando
para download gratuito. Como estão os
acessos e as críticas?
Dimitri: A divulgação está
excelente, mostrando que acertamos na escolha. O álbum já foi muito mais
baixado do que o primeiro foi vendido. Ou seja, mais pessoas tiveram acesso à nossa
música. Isso é o mais
importante, para nós o principal é que a música atinja as pessoas, as toque de
alguma maneira. Não temos a pretensão de fazer lucros com nossa arte, o que
importa é que ouçam nosso som
e gostem daquilo que fazemos. Além disso, precisamos
reconhecer uma verdade: ninguém mais compra CDs, ainda mais de bandas de metal
brasileiras. Se tivéssemos lançado o CD da maneira tradicional, amargaríamos um
enorme prejuízo, e não teríamos nem metade da divulgação que o lançamento
virtual propiciou.
Há algum plano para que o álbum tenha o
formato físico?
Dimitri: Eu adoraria, pois antes de ser
músico eu sou um fã de metal, e adoro ter o CD
em mãos, ler o encarte, acompanhar as letras. Quem começou a ouvir metal
com LPs de vinil entende o prazer indescritível
que é ouvir um disco acompanhando as letras e “viajando” na arte gráfica. Então
eu sou muito frustrado por não ver o “I
Only Smile Behind the Mask” lançado fisicamente, mas eu não sei se será
possível.
As músicas que mais curti no trabalho foram
Throwing Into Chaos e Dying Grief. Ambas apresentam técnica e
coesão. Como foi (e continua sendo) a preparação para a execução nos palcos?
Dimitri: Obrigado! Suas escolhas foram
muito boas (risos). Throwing into Chaos
já foi apresentada ao vivo, temos aberto todos os shows com ela. É uma música
perfeita para abrir uma apresentação, com a bateria furiosa, o riff galopado estilo Grave Digger e os refrãos guturais. Já Dying Grief é uma música muito difícil
de ser bem executada ao vivo, mas temos ensaiado ela repetida e exaustivamente,
até preparamos um improviso bem setentista para a hora do solo.
Psychotic Eyes Divulgação |
Outro som que chama a atenção é The Girl, que é baseada em Geni e o
Zepelim (Chico Buarque). Essa canção pode definir todas as variantes do som do Psychotic Eyes. Podemos dizer que essa
canção representa o que é o Psychotic
Eyes?
Dimitri: Acho que sim. Creio que seja a
minha música preferida da banda. Com certeza é o solo que mais gosto de tocar.
Também é outra faixa muito difícil de ser bem executada. Algo que admiro muito
nela é a linha de
bateria. O Alexandre fez um arranjo que é uma verdadeira
obra-prima, a bateria vai contando a história, com o ritmo sendo alterado à
medida que as emoções transmitidas pela letra vão sucedendo. O fraseado de
baixo também é muito interessante, e gosto muito da forma como a música
transita entre vários estilos do metal. Há riffs
Thrash, fraseados de Hard Rock e
melodias de Doom Metal. Tudo isso
dentro de uma mesma faixa, contando uma história de forma bem épica.
NHZ: Recentemente vocês estiveram na Expomusic, a maior feira de música da
América Latina. Como enxergam essa oportunidade de divulgação do som e aproximação
dos fãs?
Dimitri: Esses eventos são excelentes,
mas achei a feira deste ano fraquíssima. As marcas não trouxeram nenhuma
novidade interessante e havia poucos fãs. Mas tivemos a oportunidade de gravar
uma excelente entrevista para o
Stay Heavy , e só
isso já fez o evento valer à pena.
NHZ: Para encerrar, vou citar algumas
bandas que fazem um som na mesma linha de vocês e queria a sua opinião sobre elas:
Necromesis, Cangaço, Death e Sadus.
Dimitri:
Necromesis: Adoro o som desses caras! Gostaria muito
de tocar com eles algum dia!
Cangaço:
É uma banda que me dá muito orgulho da cena brasileira , mas não
acho o som deles parecido com o nosso, apesar de excelente. Fiquei muito
orgulhoso quando eles tocaram no Wacken,
pena que não ganharam. Sempre quis tocar no Nordeste, já acompanhei shows lá,
principalmente em Recife, e sei que é uma das cenas mais fortes do Brasil. Pena
que nunca tivemos a oportunidade de sair daqui do sudeste.
Death: É a minha banda preferida! Chuck Schuldiner é o maior gênio da
música do século XX, em todos
os estilos. É um compositor erudito, que deveria figurar ao lado de Bach, Beehoven, Tchaikovsky e Villa
Lobos, e só não é reconhecido porque escolheu emprestar seu talento ao seu
estilo preferido, exatamente o
mais extremo da música, que é o Death Metal. Além disso, ele era um
guitarrista extraordinário e um letrista profundo, verdadeiro poeta da arte extrema.
Sadus: Estaria mais confortável falando do Cynic, mas acho elogiosa a comparação do
Psychotic Eyes com o Sadus, a banda que revelou um dos
maiores baixistas de todos os tempos, Steve
DiGiorgio. Acho a banda excelente, mas creio que faltava um “algo mais”, é
uma música extremamente técnica, mas em que às vezes falta empolgação. São
poucos os compositores que conseguem acertar o ponto ideal, entre a mistura da
técnica e a emoção. Chuck era o melhor de todos, mas outros
também o fazem, como Jeff Waters
(Annihilator) e Dave Mustaine (Megadeth).
NHZ: Obrigado pela entrevista! Deixem uma
mensagem aos leitores do New Horizons Zine.
Dimitri: Muito obrigado pelo espaço e
parabéns pelo excelente trabalho que vocês fazem! Ao leitor do zine, eu quero
transmitir a mensagem de que vocês são a elite dos fãs da música de qualidade
feita no Brasil. Quem acompanha zines é o público diferenciado, que tem cuidado e amor
pela música, que não se deixa levar por modas nem aceita que a mídia diga o que se deve
ouvir. Obrigado e parabéns, o Psychotic
Eyes existe para ouvintes como vocês.
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Only Smile Behind The Mask”:
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Um comentário:
Quando vejo alguma entrevista do Dimitri faço questão de conferir, um dos caras mais inteligentes que temos na nossa cena.
Além de que sou fã do Psychotic Eyes desde a primeira demo, além de acompanhar vários shows dentro desses 10 anos! Parabéns pelo excelente disco!
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