Não é novidade pra
ninguém que o heavy metal é algo presente em nossa vida desde cedo. Para uma
minoria, uma moda passageira, mas para outros, é algo que segue até o fim dos
dias. Junto com a fidelidade, sempre surge nos fãs de música pesada, a vontade
de fazer algo a mais para que o estilo propague cada vez mais. Alguns montam
bandas, outros fotografam, escrevem e uma boa parte para o jornalismo, como o
pessoal do For HeadS. Os então estudantes Afonso Rodrigues, Flávio Camargo e
Rodrigo Paneguine escolheram o metal como tema do seu TCC e dessa escolha foi
criado o documentário Metal SP, que contém depoimentos de figuras importantes
da cena, como Ricardo Batalha (Roadie Crew), Régis Tadeu, Julio Feriato (Heavy
Nation), que falam do momento atual da cena metálica no Brasil e dos primeiros
tempos.
Confira a primeira
parte desta entrevista, em que os meninos contaram da escolha do tema, convidados e a famosa e temida hora da banca.
Por João Messias Jr.
Fotos: Divulgação
For headS com Ricardo Batalha Divulgação |
NEW HORIZONS ZINE: Vocês
se juntaram para fazer um trabalho de TCC, do qual foi concebido o Metal SP,
que faz um recorte da cena do heavy metal em São Paulo. Como surgiu a ideia?
Afonso Rodrigues:
Primeiramente, obrigado pelo convite! Eu, o Flávio Camargo e o Rodrigo
Paneghine, além de outros colegas de turma formávamos um grupinho na faculdade,
desde o início da graduação em Jornalismo em 2010. Porém, em 2012, quando o
tema TCC surgiu, o grupo se dividiu devido ao fato de que cada integrante tinha
um assunto em mente para tratar no trabalho de conclusão de curso. Eu sempre
tive vontade, obviamente, de fazer algo que gostasse e que pudesse não ser
apenas o capítulo final de minha graduação como jornalista, mas o início de
algo maior na qual eu pudesse dar prosseguimento na minha carreira. Então, eu
tinha vontade de falar sobre Jornalismo Cultural/Musical (que é a minha
editoria favorita no Jornalismo). Vi que existiam TCCs sobre Jornalismo Investigativo...
Internacional... Enfim, gostaria de saber como era trabalhar na área, qual era
o retorno... De modo geral, compreender esse segmento em um âmbito histórico e
profissional com entrevistas com jornalistas no formato documentário (Rádio
& TV era a minha segunda opção de graduação)... Algo quase
“metalinguístico”. (risos) Ao longo daquele ano cada integrante seguiu o
próprio caminho ou de forma independente partindo para uma monografia ou
entrando em outros grupos de TCC. Porém, em outubro de 2012, o Rodrigo me
propôs a ideia de retomarmos a parceria com os velhos colegas e, assim,
terminamos o curso de Jornalismo juntos. Eu topei e Flávio também. No início de
2013, começamos a ter a orientação da maravilhosa professora Lilian Crepaldi.
Já no primeiro encontro, ela pediu que fizéssemos um recorte mais específico:
“Bem, eu estou vendo que vocês se vestem de preto, são amigos... Gostam de
Rock, não é? Porque vocês não fazem algo voltado à música?” Aquilo era tão
óbvio pra mim que na minha cabeça era algo fora de cogitação. Porém, percebi
que era a hora perfeita de quem sabe falar de Heavy Metal (minha paixão) sério
pela primeira vez. Já começava a imaginar como seria legal, no futuro, olhar
para trás e ver que fiz um documentário (meu formato favorito) e sobre Metal
(meu estilo favorito)! Minha biografia ficaria ótima! (risos) Dei a ideia e
expliquei os motivos de ser assunto interessante, como o fato de que nos
últimos anos mais e mais shows de bandas internacionais estão acontecendo aqui
em São Paulo, além do interessante “boom” do nascimento de blogs e sites
especializados, por exemplo. Vimos que não tinha nenhum documentário com tema
semelhante na internet. Nascia aí o projeto “Metal SP”! Nome em referência às
clássicas coletâneas “SP Metal”. Que era, de fato, entender o cenário atual do
Metal paulistano de diferentes pontos de vista entrevistando músicos,
jornalistas e fãs.
Flávio
Camargo: Quando o grupo foi formado definimos que o projeto
seria um documentário com foco no jornalismo cultural, preferencialmente
relacionado com música. Na hora de dar início ao projeto definimos, de forma
superficial, temas que despertassem a vontade do grupo como o classic rock, o rock oriental e o heavy metal. Esse último foi escolhido
pelo ineditismo do recorte que faríamos.
Eu não sou tão próximo
do gênero, embora conheça e admire algumas bandas. Por isso vi o projeto como
um desafio. Pude conhecer algo novo e colaborar com a produção de algo
original.
Rodrigo
Paneghine: Após muitas ideias que não levaram a nada, nosso
grupo original se separou. Cada qual em um canto, surgiu a ideia dos três se
juntarem para fazer um documentário. A ideia inicial, de falar sobre música,
foi do Flávio. O Afonso cogitou o tema ser sobre heavy metal. A partir daí foi
apenas refinar o assunto e chegar ao gênero com foco na cidade de São Paulo.
For headS com Julio Feriato Divulgação |
NHZ:
E como foram os preparativos, as ideias de entrevistados. Diga-nos essa etapa
de preparação e planejamento?
AR:
No início, foi difícil, pois jornalistas sem contato é nada... Como não
fazíamos parte do meio, não tínhamos o contato de bandas, assessorias ou
jornalistas. É claro, eu já tinha uma grande lista de nomes que eu gostaria de
ver no documentário. A professora Lilian, então, passou alguns nomes de
entrevistados possíveis e que ela conhecia. O Rodrigo trabalha no prédio de
Segurança Pública do Estado de São Paulo e lá ele fez amizade com o Nelson
Corneta. O Nelson foi o nosso primeiro entrevistado. Ele foi o representante da
categoria “fã de Metal”. (risos) Foi bom começar com alguém mais próximo ao
invés de fazer o primeiro teste de cara com algum músico ou jornalista.
Começamos devagar e aos poucos fomos fazendo outras entrevistas. Uma delas com
o jornalista João Messias Jr, você o conhece? (risos) Conforme íamos entrando
no meio mais facilmente conseguíamos os contatos. Assim, surgiram grandes nomes
como Amilcar Christófaro (Torture Squad), Fernanda Lira (Nervosa) e Edu
Falaschi (Almah, ex-Angra). Outros nomes surgiram com as facilidades que a
internet nos proporciona. Fizemos contato com alguns entrevistados por e-mail e
por “in box” na rede social Facebook (risos).
FC:
Desde o início tínhamos uma ideia clara de como o projeto deveria ficar. Nenhum
de nós queria, simplesmente, um vídeo longo com vários depoimentos que não
despertassem o interesse do espectador. Por isso definimos uma lista de nomes
que nos interessavam, tanto pela bagagem quanto a forma de transmitir o
conteúdo. Já os detalhes logísticos do documentário foram definidos com o barco
em curso mesmo.
RP:
O Afonso, com seu conhecimento do cenário, surgiu com uma lista de possíveis
entrevistados. Em trio, planejamos os que seriam melhores. Apesar de nem todos
responderem, a maioria foi bem receptiva. Ao mesmo tempo, levantamos uma
pesquisa sobre heavy metal e subgêneros, orientados pela professora Lilian
Crepaldi.
For headS com Edu Falaschi Divulgação |
NHZ:
O interessante do documentário é que vocês não ficaram restritos ao passado e
conseguiram em pouco tempo sintetizar bem o que foi a cena, falando com algumas
referências da cena, como Ricardo Batalha (Roadie Crew), Regis Tadeu e gente
nova que vem representando como Julio Feriato e Fernanda Lira (Heavy Nation).
Como surgiram os contatos e o que acharam da recepção dos mesmos sobre o
documentário?
AR:
Bem basicamente, o nosso foco foi tratar do cenário atual e não o do passado.
Algo novo está surgindo. A cena está sim se movimentando. Os headbangers estão
se movimentando e criando conteúdos. Não dá para ficar apenas em saudosismo.
Queríamos fazer um retrato histórico atual. O Rodrigo foi o nosso “Relações
Públicas”. Ele foi o responsável por batalhar, na maioria das vezes, para
conseguir os contatos com os entrevistados. A recepção dos entrevistados,
felizmente, foi 101% positiva! (risos) Ganhar elogios vindo de Júlio Feriato,
Ricardo Batalha, Fernanda Lira... É algo que me deixou tão feliz que eu salvei
e-mails e até tirei “prints” dos comentários positivos no Facebook! (risos)
Isso é gratificante... É como se fosse um atestado te dizendo: “Vocês marcaram
um golaço! Continuem assim.” O legal é que os próprios ajudaram na divulgação.
Logo, ganhamos muitas visualizações do vídeo no YouTube graças a eles. A
notícia do lançamento (em 25 de janeiro de 2014, em homenagem ao aniversário da
cidade de São Paulo) do “Metal SP” foi repercutida em vários veículos:
Whiplash, Metal Samsara, Stay Heavy, Canal TV Aberta, Combate de Rock da UOL,
Double Blog, New Horizons Zine...
FC:
Em um primeiro momento tínhamos nomes e não sabíamos como entrar em contato. As
primeiras entrevistas tiveram um longo intervalo. Entretanto, após entrevistar
nomes como Ricardo Batalha e Maurício Java as coisas ficaram mais fáceis pelos
contatos que eles nos deram. Aliás, a maior parte dos entrevistados se
conhecia, o que comprova a solidez da cena na cidade. A minha impressão foi
muito positiva em relação à receptividade dos entrevistados. Todos ficaram
animados e ansiosos para saber como o projeto ia ficar.
RP:
A maioria foi bem receptiva. Alguns mais difíceis de conseguir contato (assessoria
não responde, não possui facebook / twitter pessoais, etc), porém muitos foram
por meio direto. Batalha, por exemplo, respondeu os e-mails e logo marcamos um
local / horário para gravar. Em geral, todos foram bem solícitos.
For headS com Régis Tadeu Divulgação |
NHZ:
Após as entrevistas, mudou alguma coisa em relação aos entrevistados? A
admiração virou algo negativo?
AR: Pra mim, nada
mudou. Continuo admirando o trabalho de cada um dos entrevistados. É algo até
engraçado, pois a sensação que tive foi a de segurança, já que ao invés de
surtar com a presença dos entrevistados, eu me senti como se já os conhecesse!
(risos) A diferença é que agora eles estavam em 3-D ali na minha frente.
(risos) Conversei com o Ricardo Batalha sobre a Roadie Crew em off, demos
risada com Júlio Feriato, Fernanda Lira e Amilcar, debati com Régis Tadeu e até
tomamos café da tarde com o Edu Falaschi (risos)! A imagem de ídolos intocáveis
que nunca cultivei continuou não existindo e, provavelmente, não existirá. Essa
“frieza” minha até me surpreendeu. Não me olhava com um apenas um fã
entrevistando um ídolo. Eu me via como um jornalista entrevistando outro
profissional. Mas destaco dois casos distintos em particular... Quando fomos
entrevistar o Régis Tadeu, novamente, não gerei expectativa, mas deu para
perceber que meus companheiros de grupo estavam interessados em saber se o
Régis era mesmo aquele “personagem” amargo da TV. A sinceridade dele foi algo
que sempre admirei e é isso o que faz ser diferenciado com crítico. Aprendi
muito com ele quando fomos até o condomínio onde mora. Minha admiração por ele
aumentou um pouco, sim. É provavelmente, o meu maior ídolo neste meio do
Jornalismo Musical. O lado negativo foi que um dos entrevistados se portou
visivelmente de uma forma fria conosco. A sensação é que ele estava pensando:
“Tá... Vamos acabar logo com isso que eu tenho mais o que fazer...” Apesar
disso, a entrevista foi muito boa, porém ela para por aí... Quero contar todas
as histórias dos bastidores do processo de construção do documentário em um
livro. Tem muita coisa boa e cômica ali! Ah!... Tenho que confessar, porém, que
ao final da entrevista com o Falaschi eu peguei um autógrafo (risos)!
FC:
Entre os três integrantes eu sou o mais afastado do gênero, por isso das
entrevistas acabei tirando minha primeira impressão dos personagens que
entrevistamos e ele foi positiva em todos os casos.
RP:
Ao contrário. Confesso que, no caso de alguns entrevistados, conhecia
superficialmente. Antes das entrevistas, nós pesquisávamos sobre os cantores e
jornalistas, e isso me mostrou bandas e trabalhos que eu desconhecia.
For headS com Bruno Sutter Divulgação |
NHZ:
Em documentários, a parte mais tensa é a edição, pois há muita coisa boa que,
devido ao tempo, não aparece da devida forma ou é limada. Houve algumas partes que foi muito triste ter de
deixar de fora?
AR:
Felizmente, este sentimento de perda não ocorreu, pois desde muito cedo eu já
tinha combinado com o Rodrigo que o documentário seria lançado com a marca For
headS. Logo, a ideia era de que após o lançamento do “Metal SP” na internet eu
irei também lançar as entrevistas de forma avulsa com materiais inéditos, como
se fosse uma banda lançando faixas bônus ou o conteúdo não utilizado para o
álbum oficial (risos). Aos poucos estou conseguindo publicar estes materiais.
Tem muita coisa boa também ali. Aos curiosos, inscrevam-se no nosso canal no
YouTube e curta a nossa fan page no Facebook para não perderem as novidades.
FC:
Nós sabíamos que o documentário tinha um limite de 24 minutos desde o início,
por isso tentamos realizar entrevistas mais diretas e focadas justamente para
evitar tanto material extra. Obviamente acabamos com muita coisa de qualidade
que não pode ser usada. Mas não há como ficar triste já que todo o conteúdo que
ficou de fora será exibido por meio do For Heads, que o Afonso Rodrigues vêm
tocando muito bem.
For headS com João Messias Jr. Divulgação |
NHZ:
Como foi a apresentação do trabalho para a banca? O que a banca e convidados
acharam de For Heads?
AR:
A sensação de escutar a palavra “aprovados” é sensacional... Uma coroação.
Passamos por alguns problemas técnicos na hora da banca. No caso, os
entrevistados que aparecem com microfone (Alex Rangel, Bruno Sutter e Ricardo
Batalha) estavam mudos no vídeo. Após o momento de tensão, conversei com o
pessoal da parte técnica de vídeo da faculdade e o problema foi resolvido,
porém alguns internautas ainda reclamaram deste mesmo problema na net. Enfim, a
banca foi uma oportunidade única(risos)! Ao invés de me sentir amedrontado,
estava muito relaxado afinal era o melhor tema possível pra mim. Pude me sentir
como uma espécie de professor de eavy Metal ao explicar para a banca as diferenças
entre subgêneros no mesmo. (risos) Parecia que não era uma banca... Eu falando
e defendendo o Metal na minha banca final de graduação em jornalismo... Isso é
algo que sempre lembrarei e destacarei na minha vida. Eles gostaram do “Metal
SP”. Afirmaram que ao invés de queremos “abraçar o mundo” e falar do gênero
como um todo resolvemos falar apenas do cenário da cidade de São Paulo. Outro
ponto positivo de destaque foi o de “quebra de estereótipos”. Um dos
professores se surpreendeu com a postura do público ao ver o tamanho, a
diferença de idade e sexo: “Na cena da fila (em referência a nossa cobertura ao
show do Black Sabbath) estavam todos tão felizes que pareciam que estavam indo
â um parque de diversões”. A ideia do prosseguimento do projeto com o veículo
For headS também foi elogiado principalmente quando disse que a proposta era a
de criar conteúdos que fossem tão bons que qualquer pessoa pudesse querer ver,
independente se é super fã de Metal. Que seria algo mais leve, aberto e
didático.
FC:
Acredito que conseguimos na banca o melhor cenário possível para tal evento: os
professores e o público estavam aprendendo sobre o assunto. Ter a oportunidade
de apresentar um tema como o heavy metal para pessoas que não conhecem tanto
(situação que eu vivi durante a produção) é recompensador. Nos faz pensar que
atingimos o objetivo de um trabalho de conclusão de curso, que é justamente
produzir conteúdo acadêmico de qualidade que proponha um debate.
RP:
Excelente! Alguns entrevistados estiveram presentes e a banca adorou. Um
comentário de um convidado que não vou esquecer foi "não pensava que este
era um cenário tão rico. Preciso conhecer mais".
Na próxima semana colocaremos a segunda parte desta entrevista
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